terça-feira, 3 de junho de 2008

POLÍTICA SOCIAL NO CENTRO DO DEBATE

O recente artigo de Mário Soares, fundador do PS, sobre a desigualdade social, a pobreza e a intervenção do estado, parece ter incomodado as estruturas do partido. É com alguma naturalidade que assistimos a esse incómodo, uma vez que o escrito do ex-Presidente da República, coloca a nu a política social do Governo e, acima de tudo, de José Sócrates.

Longe vão os tempos da máxima "há vida para além do défice", criada e propagandeada pelos socialistas de então, que são os mesmos de hoje, mas tendencialmente menos socialistas.

Considero indiscutível o acentuar nos últimos anos das desigualdades sociais e do crescimento da pobreza. Contudo e se quisermos ser sérios, esta degradação social não tem apenas um pai, como não tem apenas uma mãe. Não podemos assacar responsabilidades exclusivas a nenhum partido pelo crescimento exponencial deste flagelo. Estamos por isso seguramente todos a ficar um pouco fartos de ouvir e ler o nosso primeiro-ministro imputar ao PSD a origem de todas a maleitas sociais, como se nos últimos 12 anos de governação em Portugal, os nove anos entregues ao PS se desvaneçam, nesta matéria, como que por golpe de mágica.

A verdade é que Portugal raramente teve uma verdadeira política devidamente consolidada visando o progresso social. Desde o final da década de 80 em que as privatizações e uma sensível liberalização da economia procuraram corrigir as sequelas fruto da estatização proveniente do 25 de Abril, não com os melhores resultados. Essas privatizações e essa nova "abertura" da economia, permitiram a reconstrução de alguns grupos económicos entretanto desmantelados aquando da revolução, bem como o aparecimento de um capitalismo novo, ainda que na sua fase embrionária e expectante. A década de 90 foi dominada pela atribuição (algumas vezes má) e pelo aproveitamento (muitas vezes mau) dos subsídios do Fundo Social Europeu.

Mas se a liberalização económica, absolutamente necessária à época e inevitável hoje, nesta esfera globalizante, permitiu até determinado momento o enriquecimento global da sociedade portuguesa, não contribuiu de todo para a planificação de um modelo sustentado de desenvolvimento social, pese embora seja de assinalar a importância do espírito reformista, nessa matérias, dos governos de Cavaco Silva, o mais genuíno primeiro-ministro social-democrata de que tenho memória.

A verdade é que a maioria das escolas privadas continuou a ser globalmente melhor que as escolas públicas, os serviços de saúde privados, em crescendo, continuam na maioria dos casos a mostrarem-se mais eficazes e mais rápidos que os serviços públicos. A par disto, a educação, vector essencial de desenvolvimento, foi sendo demasiadas vezes alvo de alteração de estratégias reformistas, tantas e tantas vezes em sentidos diametralmente opostos.

Como consequência, o País foi crescendo "coxo" e foi deixando que a riqueza fosse cada vez mais rica, agravando as desigualdades sociais, hoje estendidas a uma classe média depauperada.

Tem razão Mário Soares no seu "aviso à navegação". Como parece ter razão ao afirmar que o idealismo, mais tarde ou mais cedo, irá voltar ao centro do debate político, dada a comprovada ineficácia das sociedades neo-liberais.

Manuela Ferreira Leite já deu um passo relevante, ao trazer para a discussão um tema tão "forte" quão pertinente. Mas mais importante é que esse tónico não caíu em saco roto.

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