sábado, 9 de janeiro de 2010

NÃO MUDAMOS PORQUE NÃO QUEREMOS

NEM SEMPRE É QUANDO NÃO PODEMOS

Não foi assim há tanto tempo que O Mirante publicou uma notícia que não deixou de me chocar como por certo chocou muitos de vós. Um homem, portador de deficiência física e por isso auxiliando-se numa cadeira de rodas para sua locomoção, havia sido ouvido num processo judicial, no tribunal de Abrantes se a memória não me falha, na rua porque o edifício não estava preparado para acessibilidades daquele tipo. Choquei-me e indignei-me porque achei o facto atentatório à dignidade do homem, que ainda assim teve o "privilégio" de ser recebido na rua por juiz, advogados e afins. Pena não se ter recusado a depor, ou a fazer o que lá ia fazer.

A falta de acessibilidades a pessoas portadoras de deficiência física (ou com mobilidade condicionada) é um dos maiores factores de exclusão social no nosso País, espalhado naturalmente quase equitativamente por todas as nossas terras. Num momento que tanto se discute o casamento e a adopção por parte de casais homossexuais, tema da moda pois, em nome da redução dos factores de exclusão todos parecem esquecer este flagelo, próprio de países em subdesenvolvimento.

Considero à muito que este é um problema cultural, de mentalidades e de sensibilidades, ou falta delas. Não é um problema técnico nem tão pouco um problema de vazio legislativo e nem sempre é um problema de falta de dinheiro. Como aqui demonstrei e continuarei a demonstrar, muitas coisas não se fazem porque não se querem fazer, porque ninguém se lembra de fazer, porque ninguém admite que há lacunas que devem ser colmatadas. Mais, que há irregularidades e, porque não dizê-lo, ilegalidades que devem ser corrigidas.

Indignei-me com o caso de Abrantes, mas mais indignado fico com múltiplos casos na minha terra. A Golegã está pejada de barreiras arquitectónicas e sobretudo urbanísticas. Perdem-se oportunidades de ouro para com parcos custos ir progredindo neste capítulo e não parece existir um plano verdadeiramente sistémico para correcção das anomalias corrigíveis. Recentemente percebi porque não o há. Porque não há sensibilidade nem vontade política. Porque há recusa em assumir que existem lacunas, porque assumi-las evidenciaria a inoperância quase total no combate às barreiras.

Sim, falo naturalmente de uma notícia de ontem no Jornal Torrejano, onde se pode ler que, após recomendações do CDS-PP/Golegã em sede de Assembleia Municipal, evidenciando a falta de um elevador no edifício dos Paços do Concelho, o responsável máximo pelo executivo respondeu que pessoas que não consigam acesso podem ser recebidas no r/chão, porque a equipa fará o obséquio de atender aí os deficientes. E acho mais chocante a resposta, que considero uma enormidade incomensurável, do que propriamente o facto do edifício não possuir elevador. Pode não tê-lo porque não houve ainda disponibilidade para o colocar, porque não há verbas, porque há dificuldades técnicas e mais um milhão de razões. Mas esta não!

Porque temos que entender que é justamente essa diferenciação que está na base da alteração da mentalidade e foi justamente para eliminar essa visão discricionária e redutora que o legislador elaborou a lei vigente. Ninguém tem que vir cá abaixo atender um deficiente, porque esse tem o direito de chegar onde chegam os outros. Ponto final.

Mas a fragilidade do argumento não acaba aqui. Afirma o nosso edil que o piso superior não é de acesso ao público. Mas as Assembleias Municipais não se realizam no Salão Nobre? E este não fica no primeiro piso? Ou se de repente houver um impertinente deficiente que se lembre de ir à reunião? A mesma far-se-á no hall? E as reuniões de Câmara públicas? Realizam-se onde? E se o impertinente insistir? P'ro hall, outra vez?

Não custava nada admitir que o deputado que colocou a questão tinha razão. Simples e inquestionavelmente porque tinha.

2 comentários:

F i l i p a disse...

Boa noite José Godinho Lopes:

Relativamente a este questão: “Mas as Assembleias Municipais não se realizam no Salão Nobre? E este não fica no primeiro piso?” permita que lhe responda referindo que o deputado do CDS-PP Gabriel Sequeira deu o exemplo da AM e foi-lhe respondido que caso houvesse necessidade as mesmas mudariam de local…

Para os leitores que não tenham tido oportunidade de ler o artigo publicado no Jornal Torrejano deixo aqui um link de acesso:Golegã: Centristas pediram instituição do dia do Campino.

Abraço

Filipa

José Godinho Lopes disse...

Cara Filipa,

Isso é o que jamais deve acontecer. No caso das acessibilidades a montanha não tem que ir a Maomé. Maomé deve ter o direito de ir à montanha quando lhe apetecer, sem que esta tenha que mudar de local para que ele lá possa ir.

É demasiado simples esta visão. Às vezes não tão simples a criação de condições para a implementar. Outras vezes ainda, demasiado complicado para quem renega a essa simplicidade.

São contributos como este, de negação da evidência, que levam a protelar situações que há muito deveriam estar resolvidas.

Infelizmente para alguns.